Número 5 - Maio de 2009

Boletins SBCCV

Editores:
Walter J. Gomes – wjgomes.dcir@epm.br
Domingo M. Braile – domingo@braile.com.br

Prezados amigos

Este é o quinto número deste ano do Boletim Científico da SBCCV, abrangendo tópicos de interesse clínico e cirúrgico.
Os artigos são apresentados em forma de resumo comentado e se houver interesse do leitor no artigo completo em formato PDF, este pode ser solicitado no endereço eletrônico brandau@braile.com.br
Ressaltamos que será bem-vindo o envio de artigos de interesse por parte da comunidade de cirurgiões cardiovasculares. Também comentários, sugestões e críticas são estimulados e devem ser enviados diretamente aos editores.

Para pedido do artigo na íntegra - brandau@braile.com.br

 

Estudo BARI 2D mostra que a cirurgia de revascularização miocárdica diminui taxa de eventos cardiovasculares maiores em pacientes diabéticos.
The BARI 2D study group. A randomized trial of therapies for type 2 diabetes and coronary artery disease. N Engl J Med. 2009; 360:2503-2515.

O estudo BARI 2D avaliou qual o melhor tratamento para pacientes com diabetes mellitus tipo 2 com doença arterial coronária (DAC) estável. Foram distribuídos aleatoriamente 2.368 pacientes com DAC e diabetes tipo 2 para tratamento médico intensivo mais revascularização miocárdica (intervenção coronária percutânea –ICP- ou revascularização cirúrgica do miocárdio –CRM-) ou tratamento médico intensivo (TMI) sozinho, além de submeter a terapia de sensibilização ou reposição de insulina. Desfechos primários foram a taxa de morte e de um composto de morte, infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral (principais eventos cardiovasculares –CV-). A randomização procedeu de acordo com a intervenção mais adequada, ICP (n=1.605) ou CRM (n=763). Os pacientes foram acompanhados por um período médio de 5 anos.
O grupo da CRM foi então distribuído aleatoriamente para receber a CRM (n=378) ou TMI incluindo estatinas, aspirina e beta-bloqueadores (n=385), e do grupo ICP para receber ICP (n=798) ou tratamento médico intensivo (n=807). Uma nova rodada de randomização foi então realizada para atribuir aos participantes, terapia de reposição de insulina (n=1185) ou terapia de sensibilização de insulina (n=1183).
Em 5 anos, as taxas de sobrevida foram 88,3% no grupo de revascularização e 87,8% no grupo TMI, uma diferença não significativa. Sobrevida também não foi significativamente diferente entre os pacientes com reposição ou sensibilização de insulina, 87,9% e 88,2%, respectivamente.
Livres de eventos CV (morte CV, infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral) também foram semelhantes em 77,2%, 75,9%, 77,7% e 75,4% na revascularização, TMI, reposição ou sensibilização de insulina, respectivamente.
Não houve diferença significativa nos resultados entre os pacientes que tiveram ICP versus TMI. Entretanto, menos pacientes submetidos a CRM tiveram eventos CV maiores em comparação com aqueles em TMI, 22,4% versus 30,5%, determinados por uma maior redução de infarto do miocárdio não fatal. No estrato ICP não houve diferença significativa no desfecho primário na comparação com o grupo TMI.
Segundo os autores do estudo, os resultados do BARI 2D reafirmam que os atuais tratamentos medicamentosos para diabetes são adequados. Os resultados também indicam que quando um paciente com diabetes tipo 2 tem doença coronária mais avançada, pode ser melhor indicar precocemente a cirurgia do que esperar e simplesmente tratar com medicação, por causa do menor taxa de IAM não fatal.
No editorial que acompanha o relato dos resultados do BARI 2D, os Drs. William E. Boden (Universidade Estadual de Nova York, Buffalo) e David P. Taggart (Universidade de Oxford, Reino Unido) escrevem que os resultados do BARI 2D resultados reproduzem a principal conclusão do estudo COURAGE, ou seja, para muitos pacientes com diabetes e doença coronariana, tanto terapia médica otimizada ao invés de qualquer intervenção é uma excelente estratégia inicial, especialmente para aqueles com doença menos severa. Quando revascularização é indicada, tanto o BARI 2D como outros estudos suportam a utilização da CRM como a abordagem preferida, pelo menos até que estudos futuros indiquem o contrário.

 

Mudanças na prática da cirurgia valvar aórtica e mitral nos Estados Unidos entre 1998 e 2005.
Barnett SD, et al. Surgery for aortic and mitral valve disease in the United States: A trend of change in surgical practice between 1998 and 2005. J Thorac Cardiovasc Surg 2009;137:1422-1429.

O tratamento cirúrgico da doença valvar cardíaca tem mudado significativamente na última década, com mais valvas mitrais sendo reparados e mais próteses biológicas sendo implantadas em posição aórtica. O National Inpatient Sample foi utilizado para documentar as tendências nos Estados Unidos da América dos procedimentos cirúrgicos isolados das valvas aórtica e mitral. Estimativa de custo e dados do pagamento total dos encargos foram fornecidos pelos Centros de Serviços do Medicare e Medicaid.
Foram analisados pacientes adultos que foram submetidos a procedimento isolado de reparo ou troca mitral ou aórtica. De 1998 a 2005, um número estimado de 330.000 procedimentos aórticos ou mitrais foi realizado nos Estados Unidos.
Desde 1998, procedimentos de reparo ou troca valvar aumentaram 186,6% e 12,6%, respectivamente. Procedimentos de reparo ou troca da valva aórtica aumentaram 102,5% e 28,0%, respectivamente, com um aumento da percentagem de reparos de 2,0% em 1998 para 3,1% em 2005.
Procedimentos de reparo da valva mitral aumentaram de 18,9% em 1998 para 45,8% em 2005, com a troca mitral diminuindo 17,2% durante o mesmo período. Desde 1998, o total faturado dos custos hospitalares para procedimentos de reparo da valva aórtica aumentou 80,6% e de troca aórtica aumentou 90,4%.
Na conclusão, durante a última década, a prática da cirurgia valvar mudou significativamente. O tratamento cirúrgico da doença mitral tem essencialmente mudado da troca para o reparo, com o uso de biopróteses mais que duplicado nessa condição. Na posição aórtica, o principal procedimento permaneceu a substituição valvar com a bioprótese sendo a escolha.

 

Uma revisão baseada em evidência sobre parâmetros ótimos de perfusão em circulação extracorpórea.
Murphy GS, et al. Optimal perfusion during cardiopulmonary bypass: an evidence-based approach. Anesth Analg. 2009;108(5):1394-417.

Nesta revisão foram resumidas as melhores evidências disponíveis para orientar a condução da circulação extracorpórea (CEC) em adultos para obter uma perfusão "ótima". Atualmente existe uma grande controvérsia relativa ao manejo mais adequado das variáveis fisiológicas durante a CEC. Pacientes de baixo risco toleram pressão arterial média de 50-60 mm Hg aparentemente sem complicações, embora dados limitados sugiram que pacientes de alto risco podem se beneficiar de pressão arterial média > 70 mm Hg. O melhor hematócrito em CEC não foi ainda definido, com uma grande base de dados demonstrando que tanto hemodiluição grave como a transfusão de glóbulos vermelhos aumentam o risco de desfechos adversos pós-operatório. A oferta de oxigênio tecidual é determinada pelo fluxo da bomba e pelo conteúdo arterial de oxigênio, assim o dano aos órgãos pode ser evitado durante grave anemia determinada pela hemodiluição aumentando o fluxo da bomba arterial. Além disso, a temperatura ótima durante a CEC varia com metas fisiológicas e dados recentes sugerem que o reaquecimento agressivo pode contribuir para a lesão neurológica. A concepção dos componentes do circuito da CEC pode também influenciar a perfusão tecidual e os resultados. Embora existam vantagens teóricas para uso das bombas centrífugas sobre as bombas de rolete, tem sido difícil demonstrar que a utilização de bombas centrífugas melhora os resultados clínicos. Revestimento do circuito da CEC com heparina pode atenuar as vias inflamatória e da coagulação, mas não foi demonstrado serem importantes para reduzir a morbidade e mortalidade. Do mesmo modo, não foram observados benefícios clínicos do uso de reservatórios venoso aberto quando comparado a sistemas fechados. Em conclusão, existem atualmente poucos dados sobre a melhor recomendação para a condução ótima da CEC. Existe uma necessidade premente de ensaios randomizados avaliando resultados clinicamente significativos, especialmente em pacientes de alto risco.

 

Aneurismas de artéria coronária após implante de stents farmacológicos.
Alfonso F, et al. Coronary aneurysms after drug-eluting stent implantation: clinical, angiographic, and intravascular ultrasound findings. J Am Coll Cardiol. 2009;53(22):2053-60.

Este estudo procurou avaliar os achados clínicos, angiográficos e de ultra-som intracoronário (IVUS) em pacientes desenvolvendo aneurismas coronários após implante de stents farmacológicos (SF). Foram analisados 1.197 pacientes consecutivos com avaliação angiográfica tardia após implante de SF. Em 15 pacientes (1,25%) se desenvolveram aneurismas coronários no seguimento. O tempo decorrido desde a implantação do stent ao diagnóstico foi de 313±194 dias. Dois pacientes apresentaram infarto agudo do miocárdio secundário à trombose do SF. Quatro pacientes apresentaram angina instável e foram submetidos a nova dilatação (3 também foram tratados por reestenose intra-stent concomitante). A dupla terapia antiagregante foi recomendado nos 9 pacientes restantes que eram assintomáticos no diagnóstico do aneurisma, mas 1 deles faleceu de choque cardiogênico após IAM relacionado com o aneurisma coronário. No acompanhamento médio de 399±347 dias, a sobrevida livre de evento em 1 ano foi de 49±14% e foi relacionada com a dimensão do aneurisma coronário. Em 2 pacientes o aneurisma coronário desapareceu na angiografia repetida e a IVUS mostrou trombose do aneurisma coronário.
Os autores concluem que após o implante de SF, os aneurismas coronários são raros e podem ser detectados em doentes assintomáticos. No entanto, os aneurismas coronários são freqüentemente associados com eventos clínicos adversos, como reestenose e trombose. Mais estudos são necessários para determinar as implicações desta nova entidade distinta.

 

Uma boa noite de sono está associada com melhor controle da pressão arterial.
Knutson KL et al. Association between sleep and blood pressure in midlife: the CARDIA sleep study. Arch Intern Med. 2009;169(11):1055-61.

Estudos epidemiológicos têm relatado uma associação entre o auto-relatado sono de curta duração e pressão arterial (PA) elevada. O objetivo deste estudo foi examinar as associações entre sono medido objetivamente e PA. Este estudo é parte do CARDIA (Coronary Artery Risk Development in Young Adults).
Nos dados ajustados por idade, raça e sexo, duração menor do sono e menor manutenção do sono estiveram significativamente associados com maior PA sistólica e diastólica, bem como outras alterações adversas na PAS e PAD ao longo de 5 anos (todos P <0,05). Curta duração do sono também aumentou significativamente as chances de incidência de hipertensão.
A evidência sugere que certa quantidade de sono é necessária para as mais diversas funções no organismo, incluindo a função imunológica e metabolismo da glicose e aumentar o período de sono em quem não dorme bem ou dorme pouco pode traduzir-se em benefícios da saúde.
Na conclusão, a redução da duração do sono foi associada a níveis tensionais elevados na PA, o que sugere a necessidade de estudos para investigar se as intervenções para otimizar sono podem reduzir a PA.

 

Na doença da artéria renal, o uso de stents não oferece benefícios.
Bax L, et al. Stent placement in patients with atherosclerotic renal artery stenosis and impaired renal function. Ann Intern Med. 2009;150:840-848.

Pouco se sabe sobre a eficácia e segurança do uso de stents na artéria renal em pacientes com estenose aterosclerótica da artéria renal (EAAR) e insuficiência renal.
O objetivo deste ensaio clínico randomizado foi determinar a eficácia e segurança da colocação de stent em pacientes com EAAR e insuficiência renal, em 10 centros médicos europeus.
Cento e quarenta pacientes com clearance de creatinina inferior a 80 ml/min e EAAR de 50% ou mais foram alocados para colocação de stent e tratamento médico (64 pacientes) ou apenas o tratamento médico (76 pacientes). O tratamento médico consistiu de anti-hipertensivo, uma estatina e aspirina.
O desfecho principal foi diminuição no clearance de creatinina de 20% ou mais. Desfechos secundários incluíram segurança e a morbidade e mortalidade cardiovascular.
Dez dos 64 pacientes (16%) no grupo do stent e 16 pacientes (22%) no grupo de medicamento atingiram o desfecho primário (razão de risco, 0,73 [IC 95%, 0,33 a 1,61]). Complicações graves ocorreram no grupo stent, incluindo 2 mortes relacionadas com o procedimento (3%), 1 óbito tardio secundário a uma infecção de hematoma e 1 paciente que necessitou diálise secundária à embolia de colesterol. Os grupos não diferiram para outros desfechos secundários.
Os autores concluem que a colocação de stent com o tratamento médico não teve qualquer efeito claro sobre a progressão da insuficiência renal, mas levou a um pequeno número de significativas complicações relacionadas com o procedimento. Os achados favorecem uma abordagem conservadora para pacientes com EAAR, focada no tratamento dos fatores de risco cardiovascular e evitando colocação de stent.


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