01/01/2010
Editores:
Walter J. Gomes – wjgomes.dcir@epm.br
Domingo M. Braile – domingo@braile.com.br
Prezados amigos
Estamos iniciando o ano de 2010 e este é o primeiro número do Boletim Científico da SBCCV, com a série completando agora o quarto ano de existência.
A seleção de artigos tem abrangido tópicos de interesse clínico e cirúrgico, com importância para todos os profissionais da área; cirurgiões, clínicos, intensivistas, hemodinamicistas, anestesistas, perfusionistas, entre outros.
Os artigos são apresentados em forma de resumo comentado e se houver interesse do leitor no artigo completo em formato PDF, este pode ser solicitado no endereço eletrônico abaixo.
Ressaltamos que comentários, sugestões e críticas são bem-vindas e devem ser enviadas diretamente aos editores.
Para pedido do artigo na íntegra – revista@sbccv.org.br
Diretrizes são contrariadas nos critérios de encaminhamento de pacientes com doença arterial coronária para tratamento cirúrgico ou percutâneo, revela análise do Banco de Dados do Estado de Nova Iorque.
Hannan EL, et al. Adherence of Catheterization Laboratory Cardiologists to American College of Cardiology/American Heart Association Guidelines for Percutaneous Coronary Interventions and Coronary Artery Bypass Graft Surgery. What Happens in Actual Practice? Circulation. 2010;121:267-275.
Apesar das recomendações das diretrizes do American College of Cardiology/American Heart Association (ACC/AHA) na indicação de cirurgia de revascularização miocárdica (CRM) e intervenção coronária percutânea (ICP), pouco se sabe sobre o impacto dessas orientações baseadas em evidências sobre as decisões de encaminhamento.
A base de dados de cateterismo cardíaco em 19 hospitais no Estado de Nova York foi usada para identificar o tratamento (CRM, ICP, tratamento clínico ou nada) recomendado pelo cardiologista no laboratório de cateterismo cardíaco em pacientes submetidos a cateterismo com angina leve ou assintomático, angina estável e angina instável/infarto do miocárdio sem elevação do segmento ST,
entre janeiro de 2005 e agosto de 2007. O tratamento recomendado foi comparado com as indicações para esses pacientes com base nas diretrizes do ACC/AHA. Dos 16.142 pacientes submetidos a cateterismo e que tinham doença arterial coronariana, o cardiologista intervencionista foi fonte final de recomendação em 10.333 pacientes (64%). Destes 10.333 pacientes, 13% tinham indicações para CRM, 59% para ICP e 17% tanto para CRM como ICP. Dos pacientes que tinham indicação para CRM, 53% foram recomendados para CRM e 34% para ICP. Dos pacientes com indicações para ICP, 94% foram recomendados para ICP. Para os pacientes que tinham indicações para CRM e ICP, 93% foram recomendados para ICP e 5% para CRM. Cardiologistas de laboratório de cateterismo em hospitais com capacidade para realizar ICP foram mais propensos a recomendar pacientes para ICP do que hospitais em que apenas o cateterismo foi executado.
Os autores concluem que pacientes com doença arterial coronária recebem mais recomendações para ICP e menos recomendações para CRM do que o indicado nas diretrizes do ACC/AHA.
No Editorial que acompanha o artigo, o Dr Raymond Gibbons, da Mayo Clinic, comenta que o estudo fornece subsídios importantes e que os resultados podem refletir, em parte, uma falta de aceitação pelo cardiologista intervencionista das diretrizes do ACC/AHA em subgrupos particulares de pacientes.
Mesmo após a publicação do estudo BARI (Bypass Angioplasty Revascularization Investigation), muitos intervencionistas continuaram a realizar ICP em pacientes diabéticos com doença multiarterial. Mais preocupante, acrescenta que eles provavelmente refletem uma política de "crescer o negócio" e "fazer volume" para os pagamentos, que estão em declínio.
"Há incentivos financeiros atraentes para os cardiologistas realizando procedimentos de intervenção para fazer mais, mesmo quando o paciente poderia ser melhor tratado com a CRM". O Dr. Gibbons concluiu que "Hannan et al estão de parabéns por este grande esforço e que em nosso sistema de saúde atua seriamente danificado, com seus perversos incentivos econômicos, este é um grande desafio."
Estudo apresentado no Congresso da STS mostra que resultados de pósoperatório feito por cirurgiões são melhores que dos intensivistas.
Whitman G, et al. Thoracic surgeons providing cardiac critical care improve patient management and decrease costs. Society of Thoracic Surgeons 2010 Annual Meeting; January 26, 2010; Fort Lauderdale, FL.
O objetivo deste estudo, conduzido no Jefferson Medical College na Philadelphia e apresentado no Society for Thoracic Surgeons (STS) 2010 Annual Meeting, foi determinar a qualidade da assistência pós-operatória prestada na UTI pelos cirurgiões comparada com a dos intensivistas.
De janeiro 2007 a fevereiro 2009 foram analisados retrospectivamente resultados de pacientes de cirurgia cardíaca em dois períodos de tempo consecutivos, durante os quais os cuidados intensivos mudaram de intensivistas para cirurgiões torácicos. Variáveis medidas foram: mortalidade esperada e observada pelo escore STS, infecções de cateter venoso central (CVC), pneumonias adquiridas,
porcentagem de pacientes recebendo glóbulos vermelhos, glicemia da manhã<200 mg% no primeiro e segundo PO, permanência pós-operatória e hospitalar, e custo medicamentoso por paciente (custo da medicação).
Nos resultados, a permanência hospitalar foi menor e houve diminuição de custos de drogas nos pacientes cuidados por cirurgiões quando comparados aos dos intensivistas.
Na conclusão dos autores, em populações semelhantes, cuidados pós-operatórios providos por cirurgiões resultaram em menor permanência hospitalar e diminuição dos custos de drogas, quando comparados aos dos intensivistas. Essas melhorias ocorreram sem sacrificar resultados nas outras medidas de qualidade.
Os autores inferem que em virtude da formação operatória e não-operatória, concentrando-se especificamente sobre as doenças cardíacas cirúrgicas, os cirurgiões podem ser excepcionalmente qualificados para prover cuidados intensivos no pós-operatório de pacientes cirúrgicos cardíacos.
Resultado do estudo SYNTAX em diabéticos reforça que a cirurgia de revascularização miocárdica é o tratamento de escolha.
Banning AP, et al. Diabetic and Nondiabetic Patients With Left Main and/or 3-Vessel Coronary Artery Disease: Comparison of Outcomes With Cardiac Surgery and Paclitaxel-Eluting Stents. J Am Coll Cardiol 2010;Jan 13:[Epub ahead of print].
O objetivo deste sub-estudo do SYNTAX foi investigar o impacto do diabetes na evolução de pacientes com lesões triarteriais complexas ou lesão de tronco de artéria coronária esquerda, tratados com cirurgia de revascularização do miocárdio (RM) ou stents eluidos com paclitaxel - TAXUS (PES).
Este estudo randomizado 1.800 pacientes (452 com diabetes) para receber o PES ou CRM.
A taxa de eventos adversos maiores cardíacos e vasculares cerebrais em 1 ano foi maior entre os pacientes diabéticos tratados com PES em comparação com a revascularização do miocárdio (15,1% vs 11,8%). Não houve diferença no desfecho composto morte/AVC/taxa de infarto do miocárdio com qualquer estratégia de revascularização em pacientes não-diabéticos (RM 6,8% vs 6,8% PES, p=0,97) ou para pacientes diabéticos (RM 10,3% vs 10,1% PES, p=0,96).
Os pacientes diabéticos tiveram risco maior de morte tanto após a CRM como PES. Mortalidade foi maior após o uso de PES (4,1% vs 13,5%, p=0,04) para pacientes diabéticos com lesões de alta complexidade. Comparado com a CRM, o tratamento com PES resultou em maior necessidade de nova revascularização tanto para pacientes não-diabéticos (5,7% vs 11,1%, p<0,001) como diabéticos (6,4% vs 20,3%, p<0,001).
Na conclusão, o diabetes está associado com pior prognóstico em pacientes submetidos a revascularização com uso de PES, quando comparados com a CRM. Os resultados deste e de outros estudos reforçam que a CRM continua a ser a estratégia de revascularização preferencial em pacientes diabéticos com doença coronária multiarterial ou lesão de tronco de artéria coronária esquerda.
Benefícios dos stents farmacológicos são limitados aos pacientes com doença arterial coronária estável.
Li Y, et al. Effect of Drug-Eluting Stents on Frequency of Repeat Revascularization in Patients With Unstable Angina Pectoris or Non-ST-Elevation Myocardial Infarction. What Happens in Actual Practice? Am J Cardiol 2009; 104: 1654-1659.
Os stents farmacológicos (SF) têm sido demonstrados reduzir a necessidade de revascularização repetida em comparação aos stents convencionais (SC) em pacientes com doença coronária estável. Entretanto, o benefício do SF em pacientes com síndromes coronarianas agudas (SCA) não está definida. Esta análise foi realizada para determinar se o SF tem vantagens semelhantes sobre
SC em pacientes com SCA. Uma coorte de 3.771 pacientes foi submetida a ICP com implante de stent em artérias coronárias nativas, sendo classificados como tendo sintomas estáveis ou instáveis e em seguida divididos por tipo de stent, SF ou SC. Embora houvesse uma diferença de eficácia, com menos eventos cardíacos adversos importantes após implante de SF para os pacientes estáveis
em 1 ano (8,2% vs 13,2%, p=0,008), este benefício não foi encontrado em pacientes com SCA (11,2% vs 12,0 %, p=0,6). Trombose de stent em 1 ano foi igualmente rara em ambos os tipos de stent. Em conclusão, a redução da necessidade de nova revascularização associada ao SF parece ser limitada aos pacientes que se apresentam com angina estável. Essa observação pode refletir a presença mais freqüente de placas vulneráveis em pacientes com SCA.
FDA aprova HeartMate II da Thoratec como terapia de destino.
FDA Approves Left Ventricular Assist System for Severe Heart Failure Patients. Device Provides Support for Those Who Are Not Acceptable Transplant Candidates. January 20, 2010. Disponível em: http://www.fda.gov/NewsEvents/Newsroom/PressAnnouncements/ucm198172.htm
O HeartMate II da Thoratec é o primeiro dispositivo de assistência ventricular esquerda (LVAD) de fluxo contínuo aprovado pelo FDA como terapia de destino para pacientes com insuficiência cardíaca em fase final (classe III-B ou IV - NYHA) e não elegíveis para transplante cardíaco.
O FDA aprovou inicialmente o HeartMate II como "ponte para transplante" em 2008 e o dispositivo está disponível na Europa para ambas as indicações desde novembro de 2005.
A aprovação do dispositivo Thoratec para a indicação terapia de destino foi baseada em estudo com 200 pacientes randomizados para receber o HeartMate II ou a bomba pulsátil de primeira geração HeartMate XVE. Os pacientes no estudo estavam em insuficiência cardíaca classe III-B ou IV, com fração de ejeção de ventrículo esquerda média de 17% e 80% desses pacientes estavam recebendo
inotrópicos intravenosos. Dos 134 pacientes randomizados para HeartMate II, 62 sobreviveram pelo menos dois anos com o dispositivo e livres de embolização cerebral (AVC). Apenas sete dos 66 pacientes randomizados para o HeartMate XVE sobreviveram em dois anos sem AVC ou cirurgia para reparar ou substituir o dispositivo.
Muito bom para ser verdade? Álcool reduz em um terço o risco de doenças cardiovasculares.
Arriola L, et al. Alcohol intake and the risk of coronary heart disease in the Spanish EPIC cohort study. Heart 2010;96(2):124-30.
A associação entre o consumo de álcool e doença arterial coronariana (DAC) tem sido amplamente estudada. A maioria desses estudos concluiu que o consumo moderado de álcool reduz o risco de DAC. Há inúmeras discussões sobre se esta associação é causal ou tendenciosa. O objetivo deste trabalho foi analisar a associação entre a ingestão de álcool e o risco de doença coronária na coorte
espanhola do estudo EPIC, 15.630 homens e 25.808 mulheres, com mediana de seguimento de 10 anos.
A Espanha é o terceiro maior produtor de vinho do mundo e nono maior produtor de cerveja. Em 2003, a Espanha também figurou na sexta posição no ranking mundial de consumo de álcool. A Espanha também tem uma das mais baixas taxas de mortalidade por doença coronária no mundo, junto com a China, Suíça e França.
Os participantes relataram quantos copos de cerveja, cidra, vinho, bebidas doces, bebidas alcoólicas destiladas ou vinhos fortificados que consumiram por dia ou por semana durante os 12 meses antes de serem recrutados para o EPIC.
Durante os 10 anos de seguimento, houve 609 eventos coronarianos (481 em homens e 128 em mulheres) para uma taxa de incidência de 300,56 em 100.000 pessoas-ano para homens e 47,93 em 100.000 pessoas-ano para as mulheres.
Em uma análise multivariada, os investigadores encontraram uma associação inversa entre o consumo de álcool e doenças coronárias nos homens, a taxa de risco diminuiu em consumidores habituais e naqueles com consumo baixo e permaneceu estável naqueles com consumo moderado, alto e muito alto de álcool.
Na conclusão, neste estudo prospectivo baseado em uma grande coorte, o consumo de álcool em homens com idade entre 29-69 anos foi associado com uma incidência de DAC 30% menor.
Clorexidina pode ser melhor que PVPI para antissepsia de sítio cirúrgico.
Darouiche L, et al. Chlorhexidine–Alcohol versus Povidone–Iodine for Surgical-Site Antisepsis. N Eng J Med 2010;362:18-26.
A pele do paciente é uma fonte importante de patógenos que causam infecção do sítio cirúrgico, portanto a otimização da antissepsia pré-operatória pode diminuir infecções pós-operatórias.
Neste estudo foram randomizados 849 pacientes adultos submetidos a cirurgias potencialmente contaminadas para preparação da pele no pré-operatório com clorexidina-alcool (n=409) ou polivinil pirrolidona iodo (PVPI) (n=440). O desfecho primário foi de qualquer infecção do sítio cirúrgico dentro de 30 dias após a cirurgia. Os desfechos secundários incluíram diversos tipos de infecções do
sítio cirúrgico.
A taxa global de infecção de sítio cirúrgico foi significativamente menor no grupo da clorexidina álcool do que no grupo do PVPI (9,5% vs 16,1%, P=0,004). Clorexidina-álcool ofereceu significativamente maior proteção do que o PVPI tanto contra infecções superficiais de incisão (4,2% vs 8,6%, P=0,008) como infecção incisional profunda (1% vs 3%, P=0,05). Os eventos adversos foram similares nos dois grupos de estudo.
Na conclusão, a pré-limpeza da pele do paciente com clorexidina álcool é superior ao PVPI em prevenir a infecção do sítio cirúrgico em cirurgias potencialmente contaminadas.